quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

E lá vem nossa heroína em mais uma aventura

No último capítulo, ela “tomou” a pílula de nanincolina...
Como toda heroína que se preze, ela tem um ponto fraco, o sono, ou melhor, a ausência dele. Ela resolve paradigmas comendo queijo, mas não mexa no sono da nossa suuuuuuper-heroína. É uma relação de causa e efeito, toda vez que o sono da heroína é afetado, desastres acontecem.
23:00 - Por volta desse horário, ela encerra religiosamente suas atividades . Chega de metrô lotado, de conversas inúteis no MSN, de levar uma hora para dar um pastel para a filha da amiga, de ser paciente com a mãe, que não para de lhe dar conselhos para casar-se, ter filhos e ser feliz, não atende mais o celular, evitando assim amigas carentes e suas sempre perguntas sem fim que não levam a nada, chega de ajudar a amigas a mentir em currículos. Enfim, chega de atos heróicos.
00:30 - Ela se deita. A essa hora, começa o concerto, dos cachorros da vizinhança. Com um ligeiro sorriso de canto de boca abre seu criado mudo em busca da sua arma secreta. Ela não tem capa super sonica, não tem batmóvel, mas tem seu suuuuuper protetor aurícular . Artigo indispensável para a tranqüilidade do seu sono. Percebe, então, que não tem mais nenhum. Sente um arrepio, um presságio...
02:00 - No meio da noite acordou, rolava na cama e nada. Como era possível? Seu sono nunca lhe deixara na mão! Depois de eternos minutos, dormiu.
05:00 - Acordou com a mãe, que tivera que sair de casa muito cedo.
05:10 - O cachorro, que é muito apegado à sua mãe, começa a lamúria. O choro era de alguém que acabou de ver seu amor partir para nunca mais voltar. Incessante, sofrido e, principalmente, irritante!
07:00 – Desiste, levanta e vai tomar banho. Nada como um bom banho matinal para renovar as energias. Vai em direção ao quarto dos pais, que tem o melhor chuveiro da casa.
07:05 – Liga o chuveiro, a água está morna, resolve mudar para o quente. Percebe que existem diversas letrinhas sobre o chuveiro. É isso mesmo, nossa heroína tem uma pequena deficiência congênita, é míope. Opta pelo lado esquerdo, com força empurra o botão com ajuda do cabo do rodo. Só se ouve o estouro! Um curto circuito...
07:10 – Positiva, pega o rodo novamente, vai mudar para o lado certo dessa vez e ficará tudo bem... Mas o botão está emperrado, com sua suuuuuuuuper força empurra e bleffffffffiiiiiiiiiitttiiiiiiiiiiiii, arranca o chuveiro, com cano e tudo, da parede.
07:11 - O chuveiro permanece conectado a parede apenas por um fio elétrico.
07:15 - Paralisada, com olhos magnetizados, acompanha o balançar do chuveiro preso ao fio da rede elétrica, tal qual uma sessão de hipnose .
07:20 – Imóvel, nossa super lê, com muito esforço, as letrinhas: Fria, Morna, Quente, Muito Quente. Permanece ali, nua, com o cabo do rodo na mão, lembrando o quanto seu pai gostava de tomar banho naquele chuveiro, o melhor da casa.
07:22 – Depois da paralisia, recupera as forças e vai em direção ao outro banheiro. Pensa: tudo bem, banho, renovo minhas energias e sigo em frente... Liga o chuveiro, água fria, toca o interruptor para acender a luz, nada. O curto circuito foi na rede elétrica da casa...
07:25 – Pensa em banho à sueca, ou, de gato... mas desiste. Afinal, precisa renovar as energias...
07:30 – Vai à cozinha, respira fundo, banho de canequinha também renova energia. Coloca panela no fogo, mas não consegue ligá-lo, fogão elétrico.
07:32 - O vício a salva, encontra o isqueiro junto ao maço de cigarros.
07:40 - Nossa heroína lava o balde. Sim, ela tem super poderes, mas sua pele não está preparada para os produtos químicos terráqueos.
07:45 - Começa o banho de canequinha e se sente uma futurista, afinal, esse será o banho do futuro, devido a escassez de água.
08:20 - chega ao metrô, teme em segurar na barra devido à sua suuuper força, mas não é preciso, a super lotação impede que uma agulha caia no chão. Todos os espaços estão ocupados por corpos, bolsas, mochilas e afins.
09:20 - Chega ao trabalho , tropeça em uma moça atarantada no elevador que, irritada, explica que não consegue chegar ao quarto andar. Nossa heroína explica que ela terá que ir para o outro elevador. A mulher fixa seus olhos nervosos na heroína e diz “hoje ta difícil, sabe aquele dia que nada dá certo?”. A porta do elevador se fecha...

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Love Station


Chego ofegante, mas perco o ônibus. Irrito-me. Minha agitação é neutralizada pela ansiedade da mulher à minha frente. Respiro Fundo. Sinto o cheiro do amor. O amor maduro é elegante e ansioso, a mulher desassossegada espera por alguém... me distraio. Quando vejo, a mulher caminha ao encontro do sossego.
Ele todo sorriso, conta histórias sobre filhos, escolhas e cafés. Lança seu longo braço sobre o corpo dela. A expressão de sua saudade é medida pela a força que emprega ao apertar carinhosamente o antebraço dela. Permanecem conversando, “quase abraçados”. Ela continua ansiosa, mas espera, até o momento que ele a abraça por completo, aí sim, ela se joga e oferece sua boca. O beijo cala o descompasso.
O amor da juventude tem cabelos sedutoramente desalinhados, e caminha em linha reta, vai e volta, vai e volta, vai volta, vai e volta... um vulto passa por mim. É ela correndo, não tenho tempo de vê-lo, ela se joga em seus braços e rouba um beijo.
Minha boca faminta engole seco. Enquanto minha história não chega, farejo à minha volta o amor alheio, que não alimenta, mas me mantém viva.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Nem tudo virou Musica

POUSO PACATO EM PLUTÃO
Raul Seixas


Estou perdido na varanda de mercúrio sem asas para perseguir o meu eco.
Estou dominado pela rainha Medusa, sentada na sua poltrona de veludo
verde com seus nove cães de prata ao lado.
Estou agora em labirinto de anis, onde mordomos gentis sorriem bemóis.
Me cumprimentam cordialmente, centauros errantes nos pastos lilazes do
lado de fora. Cavalgo em renas de rendas em desvairada velocidade para,
angustiado, alcançar seus cabelos de nylon que enfeitam a bandeira de sonhos.
E lá se vai eu.
Estou correndo no sangue de verdes veias duma idéia que brotou da fonte do
ano que passou.
Sento-me no amarelo. Estou chorando em hipérboles!
Estou perdido na varanda de mercúrio sem asas para perseguir o meu eco.
Estou no espaço cósmico. Na plasmobiose do universo que se agiganta e me
engole.
Estou há bilhões de anos-luz distante de mim mesmo.
Gente de cera lustrosa arrastam seus (corpos?) em direção à porta para o
nada.
Suco de clorofila borbulha em espumas verdosas em canecos de bronze,
onde anões bebem sem boca.
Agora onde estou não sei.
Nem nunca soube.
Estou no cume do arco-íris?
Na parte roxa daquele transferidor?
Sei lá. Nem m’importa.
Sentado, sozinho, sem medo de cair, às sete horas de cores e uma mistura,
eu POUSO PACATO EM PLUTÃO montado numa borboleta gigante, tranqüila,
quieta e colorida.
Pouso pacato em Plutão. Com um guarda-chuva e uma máquina de costura...
(daquelas Singer antigas de pedal, que vovó usava para gorrinhos pra mim).
E a chuva promete não deixar vestígios...

SEIXAS, Raul. As Aventuras de Raul Seixas na Cidade de Thor.; Rio de Janeiro:
Shogun Arte, 1992. Pág 51 e 52.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Inês é morta, beijem sua mão.

"Eis um depoimento da época: Dom Pedro mandou que fizessem para ela um mausoléu de pedra branca, inteira e sutilmente trabalhado, representando, sobre a tampa, sua cabeça coroada como se ela, Inês de Castro, houvesse sido rainha; e foi esse mausoléu que ele mandou colocar em Alcobaça [...]. O corpo viajou em um ótimo cortejo para a época, desses em que há grandes cavalos montados por grandes cavaleiros, damas e donzelas e muita gente do clero; e ao longo do caminho havia mais de mil homens com círios nas mãos, dispostos de maneira que seu corpo seguiu durante todo o caminho entre as velas acesas.
O rei Pedro I mandou esculpir sua história em detalhes no próprio túmulo. E quando ele morreu, em janeiro de 1367, seu corpo foi enterrado próximo da bem-amada. Os corpos não foram colocados lado a lado, como seria mais natural, mas um de frente para o outro, para que no dia da ressurreição pudessem se levantar e cair nos braços um do outro.
Os suntuosos túmulos de pedra branca dos trágicos amantes podem ser visitados no mosteiro de Santa Maria de Alcobaça. Sobre o de Pedro, está escrito que os dois permanecerão juntos até o fim do mundo...."


Amor morre? Não pra mim, amor é feito passarinho, não morre, migra.
Recentemente reencontrei um amor, foi como visitar um túmulo, estava tudo lá. A mesma árvore onde escrevemos nossos nomes, a mesma casa, o mesmo passeio de moto no fim de domingo, até o mesmo pôr- do- sol. Os mesmos corpos.
Mas ao contrário do que você pode pensar, eu não era Inês, eu era aquela vela acessa que lhe fazia reverência. Não tenho dúvida que, um dia, acordamos eu e o meu amor e permanecemos abraçados até hoje. Não é ficção científica, é sentir .
Acredito que cada um de nós, Pedros e Inês, vivemos em tempos distintos. A magia ou , se preferir, o amor, é o encontro desses tempos. O mistério, o tempo desse encontro é irregular – pra mais ou pra menos, não importa. O pacto se cumpriu. Estão dispersos no tempo e no espaço da eternidade o gosto dos nossos beijos, nossa transpiração, nossa falta de ar, a sonoridade do dilatar nosso coração, o teu cheiro e o meu. .. você e eu estamos pulverizados pelo mundo, quem sabe um beija- flor já se alimentou da doçura de seus lábios ou alguém já sentiu o perfume feito da junção de nossos corpos.
Assim, quando deparar-se com a Inês, não tema, chega de brincar de caça fantasma. Inês está viva, por isso, beije-a!