segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Nem tudo virou Musica

POUSO PACATO EM PLUTÃO
Raul Seixas


Estou perdido na varanda de mercúrio sem asas para perseguir o meu eco.
Estou dominado pela rainha Medusa, sentada na sua poltrona de veludo
verde com seus nove cães de prata ao lado.
Estou agora em labirinto de anis, onde mordomos gentis sorriem bemóis.
Me cumprimentam cordialmente, centauros errantes nos pastos lilazes do
lado de fora. Cavalgo em renas de rendas em desvairada velocidade para,
angustiado, alcançar seus cabelos de nylon que enfeitam a bandeira de sonhos.
E lá se vai eu.
Estou correndo no sangue de verdes veias duma idéia que brotou da fonte do
ano que passou.
Sento-me no amarelo. Estou chorando em hipérboles!
Estou perdido na varanda de mercúrio sem asas para perseguir o meu eco.
Estou no espaço cósmico. Na plasmobiose do universo que se agiganta e me
engole.
Estou há bilhões de anos-luz distante de mim mesmo.
Gente de cera lustrosa arrastam seus (corpos?) em direção à porta para o
nada.
Suco de clorofila borbulha em espumas verdosas em canecos de bronze,
onde anões bebem sem boca.
Agora onde estou não sei.
Nem nunca soube.
Estou no cume do arco-íris?
Na parte roxa daquele transferidor?
Sei lá. Nem m’importa.
Sentado, sozinho, sem medo de cair, às sete horas de cores e uma mistura,
eu POUSO PACATO EM PLUTÃO montado numa borboleta gigante, tranqüila,
quieta e colorida.
Pouso pacato em Plutão. Com um guarda-chuva e uma máquina de costura...
(daquelas Singer antigas de pedal, que vovó usava para gorrinhos pra mim).
E a chuva promete não deixar vestígios...

SEIXAS, Raul. As Aventuras de Raul Seixas na Cidade de Thor.; Rio de Janeiro:
Shogun Arte, 1992. Pág 51 e 52.

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