quinta-feira, 30 de abril de 2009

Gostoso ser conduzido
Não definir o caminho
Ou pelo menos, não todo ele

Delícia cavalgar sem rédeas
Ao bel prazer do surreal
Fluir conforme a maré

Fácil é andar sem decisões
Na contramão das tendências lógicas
No refluxo vespertino
E tentar herdar o espólio irreal
Torcer pela fantasia e abstrair a sintaxe.

Nutri-se da fome rotineira
Surgir na alvorada escura
E fazer a fotossíntese lunar

Desejar sumir em um copo americano
Ser absorvido pelas raízes de uma árvore urbana
E por fim, plagiar tudo aquilo que ainda não foi pensado

Mas, por ora, elaboremos mais um orçamento.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Menino à moda antiga

Eu sempre acho que o mundo conspira contra mim, ou a favor, meus amigos já me explicaram que é o oposto. Eu conspiro a partir do mundo. Mas diga você se eu não tenho razão. Em um mesmo dia, um menino de 6 anos fez questão de abrir a porta do elevador para que eu entrasse , e um senhor de 70, após meu espirro ardido, disse: estimo melhoras. Homens à moda antiga. Me fez lembrar um certo menino...
Meu menino à moda antiga. Ele é calado, mas fala com os olhos. Antes de me beijar, segura a minha nuca. Depois do beijo, me aperta contra seu peito e beija a minha testa. Pergunta se pode me acompanhar até em casa. Segura a minha mão e me coloca do lado de dentro da calçada. Ele é íntegro e não cede a pressões, pensa no futuro e vive arquitetando coisas por aí...Eu envio e-mail pra ele, mas ele responde como se fosse uma carta: lê, pensa e recebo o e-mail-resposta depois de uma semana. Ele não tem coragem de dizer que não quer nada comigo, então diz: obrigado por ligar. O menino à moda antiga não é meu, é do mundo. E no fundo, fico contente em saber que, a qualquer hora, uma garota vai ganhar beijos em noites de lua cheia, andará abraçada debaixo da chuva e suspirará. Afinal, ainda existem homens à moda antiga.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Retrato

A qualidade da foto não é das melhores, mas eu asseguro que as maças do rosto do seu Aldo são vermelhinhas!
Ps: Quem quiser conhecer o seu Aldo é só ir até o bar Balcão em São Paulo.

terça-feira, 14 de abril de 2009

TROCA DE PASSE

Por Júlio Canuto*
Esta era para ser uma crônica sobre futebol, mas como em São Paulo sempre sofremos com contratempos – que nunca estamos preparados -, é mais do que isso. Esta é uma crônica sobre o dia a dia do paulistano, que tem como um de seus principais momentos de escape, o futebol, onde extravasa seus sentimentos.

Preliminar:
Quinta-feira, 09 de abril de 2009. O São Paulo F.C. vai jogar contra o Defensor Sporting, do Uruguai, pela Copa Libertadores da América. Como todo são-paulino, espero ansioso, pois esta é a competição que mais gostamos, uma das que mais ganhamos e o sonho de todo grande time. Hoje em especial, pois ganhei dois ingressos para o jogo, numerados, no conforto.

18:00 hrs, chamo o Messias, torcedor são-paulino que trabalha comigo e tem certa semelhança com o mascote tricolor e saímos rumo ao Morumbi. Da Vila Mariana até o Morumbi é rápido, de carro com trânsito livre dá meia hora. O jogo é as 19:15hrs.

Saímos. Ligo o rádio do carro para entrar no clima. Já estão falando sobre o jogo. O São Paulo entrará com força máxima, brigando pela classificação e para manter a liderança do grupo. Já o Defensor entra um pouco modificado, 3 alterações em relação ao último confronto, no Uruguai. Sinto cheiro de goleada. A noite é quente, a lua é cheia, amanhã é feriado. Tudo propício para uma ótima noite.
Mas...

Mas estamos em São Paulo, e estes fatores têm também seu lado ruim. Primeiro: 18:00hrs = horário de pico = trânsito; segundo: véspera de feriado e calor = trânsito; terceiro: jogo no Morumbi = trânsito nas avenidas próximas. Transito, transito e transito.

Começamos a andar taticamente pela cidade, procurando uma brecha pela qual poderemos chegar à cara do gol. Tentamos uma rota: marcação cerrada, implacável, impossível passar. Tentamos outra, agora com sucesso, mas o caminho fica um pouco maior. Troco de estação no rádio. SulAmérica Auto. As instruções técnicas sobre o trânsito procuram ajudar, mas está difícil. O maior congestionamento do ano: 230km. Jogo truncado nas ruas de São Paulo.

Nos carros ao lado já vejo outros são-paulinos, todos no mesmo ritmo de jogo. Trocamos passes, pedimos um lançamento, e o jogo continua...

Triiiiiiiiiiila o apito o árbitro. Bola rolaaaando. Começa o jogo:
Começa o jogo no Morumbi. No carro, continuamos tentando o drible perfeito. O São Paulo entra em campo, mas o ritmo não é bom. São Paulo não anda hoje, está travado. O comentarista diz que Hernanes quer caprichar demais e erra passes, enquanto Arouca não repete suas boas atuações. Do lado de cá, Júlio se mostra apreensivo, não chega na bola, e Messias procura um espaço no trânsito, sem sucesso.

O teeeeempo passa, tooorcida brasileira. O locutor avisa: 38 minutos do primeiro tempo. Bola com o Defensor, cruzamento, Rogério Ceni vai fácil pra bola, espalma de forma estranha e... ela cai dentro do gol: Defensor 1, São Paulo 0.

“- Não posso acreditar!” – digo a Messias, ainda imóveis na Av. Morumbi.
Jogo tenso:

- “Caralho! Não acredito! Já perdemos o 1º tempo todo. Deste jeito vamos perder também o 2º” – acrescento.

E assim termina a primeira etapa.
No intervalo o time conversa. Muricy tenta ajeitar a equipe para a segunda etapa. Sai Zé Luiz e entra Dagoberto. O São Paulo vai pra cima.

“- Júlio e Messias, é com vocês. Entrem lá e virem o jogo” – falo que Muricy falou.
Aviso:

“Um gol meu e outro seu, Messias”

Finalmente estacionamos. Logo de cara uma advertência: R$20,00 pra deixar o carro na rua. Mas não nos abatemos e vamos pro jogo.
Morumbi lotado.

Tudo pronto. Comeeeeeça o 2º tempo.

O São Paulo vai pra cima, é outro time. Mais agressivo, nem sombra da apatia do 1º tempo. Dagoberto dribla, faz bons passes. Hernanes joga simples e bonito. A defesa se acerta, não dá espaço aos uruguaios. Um lance de perigo atrás do outro. A torcida incentiva, não pára um só minuto de cantar.

Bola na lateral, o atacante do São Paulo avança, invade a área, o goleiro sai, um simples toque pra encobri-lo e... na traaaaaaave. No travessão. Uuuuuuuuuhhhh.

Mas o tempo ta passando, chegamos à metade do segundo tempo. Bola levantada na área, Washington escora de cabeça e Borges pega de primeira, uma bola quase perdida que vai no ângulo: GOOOOOOOOOOOOOOLLLLLL, do São Paaaaaaaaulo.

A voz começa a sumir, ficamos roucos.

E maaais um ataque. Outra bola levantada na área, confusão, bate-rebate e... Olho no lance: ÉÉÉÉÉÉÉÉÉÉÉÉÉ DO SÃO PAAAULO. CONFIRA COMIGO NO REPLAY, FOI, FOI, FOI, FOI, FOI, FOI ELE: DE NOVO, BOOORGES, O CRAQUE DA CAMISA Nº 17. Quando eram jogados redondos 28 minutos da segunda etapa, após a confusão na área com o bico da chuteira ele tira do goleiro e acerta o canto esquerdo da meta do goleiro uruguaio, sem chances de defesa.

Com este resultado o tricolor garante a classificação e fica a um empate de garantir também o 1º lugar no grupo.

Todos felizes no estádio! As bandeiras se agitam. O Morumbi é só festa. A festa está completa. O São Paulo administra o jogo no campo do adversário e ainda chega com perigo.

Agora sim, depois de um dia dificílimo, teremos tempo pra tomar umas cervejas, comer o lanche de pernil e comentar a partida e nossa fundamental participação no resultado. Demos sorte, precisamos ir mais vezes! Pois aqui dentro do estádio não há tempo para mais nada, o juiz apita: FINAL DE JOGO! Tivemos nossa porção de sofrimento, temperada com pitadas cotidianas de alegria, que deu o sabor da noite.
Troca de Passe é uma proposta de um texto com duas "visões" de um mesmo jogo, para ler a continuação acesse: http://pulaomuro.blogspot.com/ e veja como "as meninas", eu, também brincam de jogar bola. Aproveite e leia os textos coletivos escritos por Júlio e Leonardo, os caras batem um bolão!

quarta-feira, 8 de abril de 2009

O som da minha infância

Eu deveria ter por volta de 7 anos quando mais uma família mudou para a casa vizinha. Era curioso, mas as famílias nunca permaneciam na casa por muito tempo. Toda vez que uma família mudava, novos costumes eram instaurados.
Nenhuma das famílias me impressionou mais que aquela, não lembro nomes, me esforço, mas não consigo. Lembro deles: um casal e duas filhas. Eles tinham costumes curiosos, não havia lixo no banheiro, às vezes o encanador visitava-os, mesmo assim não alteravam o costume. A caçula, da minha idade, gostava de brincar de dentista e a mais velha vivia batendo portas, mais tarde descobri que isso não é tão diferente assim, na verdade, é bem normal, na adolescência. Mas o que realmente marcou foi o pai delas, ele tocava Jazzofone. Porém, nunca tocava na presença da família, e toda vez que ia tocar, fechava toda a casa. Quando eu o via fechando as janelas, sabia: era hora do show. Ele tocava por volta de 1 hora, eu sentava na escada, do lado de fora da minha casa, e ouvia. Até hoje não sei o que ele tocava, mas sentia. Por vezes lembro-me daquele homem - sozinho, fazendo música e abafando sua sonoridade aos olhos do mundo.
A lembrança de uma menina de pernas finas, pequena em relação àquela escada, ouvindo o som abafado que vem da casa vizinha é uma das lembranças mais fortes da minha infância. Esse é o som da minha melancolia.